No entanto, muito se tem falado sobre educação, sobre os acordos e protocolos que têm sido criados entre as universidades do mundo lusófono, mas pouco se tem falado sobre os estudantes que são a "ponta do iceberg" desse desenvolvimento. Como referiu Sílvia Nogueira, professora da Universidade Estadual da Paraíba (em uma comunicação que fizemos em conjunto), tem-se olhado MUITO POUCO para os estudantes, enquanto pessoas que precisam ser acolhidas e integradas na sociedade que os recebeu.
Por isso, antes de mais, é preciso ter em atenção que os jovens na diáspora têm as suas culturas (e é natural que queiram mantê-las), e que se não contribuirmos para a criação de identidades transnacionais, será cada vez mais difícil formar cidadãos globais, enfatizou Emellin de Oliveira, investigadora do Centro de Investigação e Desenvolvimento sobre Direito e Sociedade (CEDIS).
Estas foram algumas das conclusões da conferência "Educação de Qualidade e Desenvolvimento na Lusofonia", promovida pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa em conjunto com o Instituto Camões. Esta conferência, que aconteceu entre 6 e 7 de Junho de 2019, debateu o objetivo número 4 presente na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), Educação de Qualidade.
Foi, portanto, muito bom ver pessoas pertencentes às diversas comunidades dos países de língua portuguesa (CPLP) discutirem, em Portugal, um tema que parece que em outros países da CPLP não tem recebido a devida importância.
De acordo com Ana Paula Laborinho, Diretora da Organização dos Estados Ibero-Americanos, hoje quando falamos em educação de qualidade e desenvolvimento é fundamental perceber que o desenvolvimento também passa pelo ensino superior. Muito se tem discutido a importância da educação de base, querendo, desta forma, diminuir a importância que o ensino superior também tem em todo o processo de formação ao longo da vida. Se, como disse Flávio Inocêncio, "o segredo do sucesso no ensino superior está no ensino primário", por outro lado existe hoje um "divórcio" entre o ensino de base e o ensino superior. Por isso, para este professor, quando se pensa em políticas públicas "não basta só falar em educação e não prestar atenção em outros aspectos institucionais".
Segundo Laborinho, sabe-se hoje que, "também através das artes conseguimos chegar à educação para a cidadania". Por isso, se queremos formar cidadãos que possam contribuir para o desenvolvimento, devemos "pensar a educação não na perspectiva dos alunos que temos, mas daqueles que ainda não temos", ressaltou. Enfim, devemos pensar mais nos alunos, nas suas culturas, e no aprendizado que o estímulo a troca cultural poderá proporcionar.
Ana Paula Laborinho, Diretora da Organização dos Estados Ibero-Americanos |
Mas se quando olhamos para a educação na diáspora nos deparamos com programas escolares feitos ainda contra os "outros" (ex-colonizados) e não com eles (como referiu Laborinho), como conseguiremos promover uma educação para a cidadania?
Essa é uma pergunta difícil de responder quando se percebe que isto ainda acontece não só nos países que já foram colonizadores, mas também naqueles que já foram colónias. O Brasil, por exemplo, ex-colónia de Portugal, tentou através da UNILAB - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira - fazer uma reparação histórica com África, mas acabou por implementar uma universidade "muito neocolonial", como referiu Marcela Magalhães de Paula, da Embaixada do Brasil em Roma. Essa falta de ver os "outros" como iguais, e não como seres superiores ou inferiores, fez com que a implementação da UNILAB pecasse pela falta de preparo dos seus professores, falta de estrutura na cidade onde nasceu (Redenção/ Ceará), para além de uma falta de aceitação dos habitantes locais (o que alimentou o preconceito). Ou seja, houve uma falta de integração dos estudantes dos países africanos de língua oficial portuguesa, o que criou divergências com os pertencentes a outras religiões e aumentou a violência na cidade. E aqui voltamos ao início deste texto, onde, uma vez mais, vimos que é necessário pensar não só na educação, mas no "outro" como um ser humano, que merece ser integrado na sua nova sociedade de acolhimento, que merece ter a sua identidade respeitada para que assim possa criar uma identidade transnacional e, só desta forma, se transformar num cidadão, mas num cidadão global.Sílvia Nogueira, Flávio Inocêncio, Luzia Moniz (moderação), Marcela Magalhães de Paula |
Por isso debater a educação de qualidade, a educação na diáspora, e a educação no mundo lusófono sempre será muito importante. Este foi o terceiro evento sobre o tema, em que estive presente este ano, o que demonstra que esta é uma preocupação cada vez mais transversal às diversas áreas do conhecimento, que buscam respostas, soluções e novas formas de assegurar uma educação/ formação de qualidade ao longo da vida. Desta conferência irão resultar "materiais científicos, que serão divulgados amplamente através do livro de atas e da disponibilização, em vídeo, de toda a conferência", os quais prometo divulgar aqui!
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